quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Sociedade de propósito específico: aspectos gerais

A sociedade de propósito específico ( SPE ) começou a aparecer no Brasil no caso da recuperação judicial da Varig e posteriormente na formação das parcerias público-privadas, sendo ela utilizada anteriormente nos EUA, sob a denominação de Special Purpose Entity e na França conhecida como sociedade ad hoc.

A sociedade deverá estar revestida dos requisitos necessários para sua constituição e desenvolvimento, as quais são exigidas para cada tipo societário previsto em lei e a análise de cada caso concreto é que determinará qual o melhor tipo, assim, a sociedade deverá possuir determinado número de sócios, capital, objeto social, duração, localização, nome, etc.

Uma vez definido o tipo societário e sendo preenchidas as condições necessárias para sua constituição ela será levada ao registro competente para ser registrada. O registro dependerá da atividade que será exercida, se o objeto for civil, o registro será no Registro Civil de Pessoas Jurídica e se for empresarial ou sua forma empresária, o registro inicial será feito junto a uma das Juntas Comerciais de cada Estado. Após o registro as repartições administrativa também têm que ser comunicadas, para que ela possa obter, por exemplo, seu registro no cadastro nacional de pessoas jurídicas.

O uso da sociedade de propósito específico deve ser lícito e não ser utilizado de forma fictícia, pois, neste último caso poderá haver a desconsideração de sua personalidade jurídica. Dizemos isso porque parece que existem algumas intenções em se constituir uma sociedade de propósito específico para desvio de bens e proteção patrimonial, onde algumas pessoas buscam constituir uma sociedade de propósito específico para deixar de pagar seus credores. Neste caso o propósito específico seria não pagar os credores e sua personalidade jurídica seria desconsiderada.

A terminologia empregada não deve ser utilizada para esconder seu conteúdo, ou seja, a forma não deve prevalecer sobre o fundo da questão, por isso, é preciso estar atento e observar o mérito da sociedade de propósito específico para ver se ela realmente está buscando atingir seu propósito.

Qual o futuro da advocacia?

Há uns 10 anos tive a oportunidade de assistir a uma palestra com o ex-padre Lauro Trevisan sobre o poder da mente e inclusive comprar seu livro chamado A era de Aquário.

Sua apresentação, bem como seu livro, falam sobre o poder da mente e o cerne da questão é que tudo aquilo que vemos externamente, primeiro ocorre internamente. A era de Aquário, já dizia ele, será marcada pelo domínio do imaterial sobre o material. E este pensamento, será aplicado à advocacia? Não tenho dúvida que SIM!!!

Após a metade do século passado e ainda até o presente momento a materialidade domina, porém, vem se enfraquecendo e seu fim está próximo. Começaram a surgir as grandes bancas de advocacia, com estruturas imensas e custos altíssimos, aqui o que vale é aparência, a materialidade para impressionar o cliente, o qual acaba pagando por tudo isso, ou seja, mais vale o material do que o imaterial, o cliente contrata e não conhece nem as qualidade do advogado que irá prestar o serviço.

Neste início do século, devido ao uso da internet, a situação mudará, o imaterial dominará o material! O conhecimento do advogado começará a ser valorizado e não mais sua estrutura física. O cliente saberá quem estará realizando o trabalho para ele e terá oportunidade de conhecer suas qualidades profissionais. A estrutura que interessará para o cliente são as pessoas e não a casa ou o prédio onde está instalado. Assim, o cliente poderá contratar um advogado de Manaus, para fazer sua ação em Curitiba. Como? É muito simples. Hoje basta serem encaminhados, por exemplo, os documentos através de “scanner” para o advogado e este encaminhar a petição por Sedex para seu cliente ou para seu correspondente em Curitiba através de e-mail numa fração de segundos!

Esta é a realidade hoje, pois daqui a pouco os advogados já terão sua assinatura digital e os tribunais informatizados, isso permitirá que o advogado encaminhe sua petição de Manaus diretamente para o destino, inclusive com os documentos.

Estamos na era de Aquário, era da imaterialidade, onde o futuro da advocacia está baseado no conhecimento do advogado e não mais na sua estrutura física.

Os beneficiários do dano moral

A questão envolvendo o dano moral enfrenta três grandes problemas. Um deles se refere a ausência de descrição taxativa na lei para saber quando está caracterizado o dano moral, outro ao valor da indenização e ainda quem são os beneficiários do quantum referente a indenização. Neste artigo nos limitaremos a discorrer sobre o último deles.

Como exposto anteriormente, a dificuldade em estabelecer quem são as pessoas que se beneficiam no dano moral é muito grande. A lei, nem a doutrina e a jurisprudência têm um posicionamento claro a este respeito e isso faz com que a incerteza jurídica se torne evidente. Dessa forma, sem querer esgotar o assunto, procuraremos apontar uma solução, dentre as possibilidades que existem.

Pode-se afirmar que o valor da indenização é destinando a quem sofreu o dano. Se quem sofreu o dano deve recebê-lo em vida, outras pessoas próximas a vítima também poderiam se beneficiar do quantum da indenização? Digamos que alguém é assediado moralmente. No assédio moral normalmente o assediado busca auxílio junto a pessoas próximas, familiares, parentes, namorada(o), noiva(o), amante, amigos e médico. O valor da indenização seria ampliado a todas estas pessoas? Parece lógico que o médico que não tem nenhuma relação de afetividade não se beneficia. Com relação aos amigos, embora exista afetividade, também não existe a possibilidade, já que o dano moral poderia ser ampliado de forma quase que ilimitada. A situação das pessoas próximas, onde existe a afetividade e limitação, como os familiares, parentes, namorada, noiva e amante, parece um pouco mais questionável. Numa visão restritiva, somente o assediado tem direito ao recebimento porque somente ele é atingido diretamente pelo assédio enquanto que seus familiares e parentes somente poderão ser atingidos de forma indireta com o sofrimento do assediado. Numa visão mais aberta, os familiares, parentes, namorada(o), noiva(o) e amante também poderiam se beneficiar.

Quando a vítima do dano moral não morre, mas está em estado inconsciente, quem é beneficiário do dano moral? Somente a vítima que é atingida diretamente ou outras pessoas podem ser atingidas indiretamente, como na situação anterior? Neste caso as visões restritiva e aberta também são possíveis de se aplicar.

O valor da indenização por dano moral acaba se revelando como um dano patrimonial com a morte da vítima porque seu valor é transmitido a seus sucessores, porém, os sucessores podem ser não somente os familiares, mais também parentes que se não fosse nenhuma ligação de direito, poderiam ainda ser desafetos da vítima. Isso serve para ser demonstrado que os beneficiários do valor da indenização por dano moral devem receber o valor da indenização não pela relação de afeto, dor que estão sofrendo face ao estado da vítima e da proximidade que tem com a mesma, mas sim porque o dano moral deve ser avaliado segundo o direito subjetivo ou interesse lesado, ou seja, a indenização ocorre porque houve lesão de um direito subjetivo ou interesse extrapatrimonial e não porque alguém está sofrendo.

Ao isolarmos o valor da indenização do dano moral segundo a ou as pessoas que o sofrem e o ligarmos ao direito ou interesse lesado, o beneficiário do dano moral é somente a pessoa que o sofre e se esta morrer, o beneficiário serão seus sucessores, assumindo assim o valor da indenização um caráter patrimonial, deixando ele de ser subjetivo.

Dessa forma, entendemos que o valor da indenização por dano moral decorre da lesão de um direito ou interesse subjetivo não materializado e seu pagamento se materializa e é destinado a determinado beneficiário ou beneficiários como se tratasse do ressarcimento de um dano material, ou seja, a diferença é que o dano material ocorre pela lesão de um direito ligado a uma matéria enquanto o moral a algo que não é materializado, porém, ambos estão ressarcindo um direito subjetivo ou interesse lesado.

Assim, podemos levantar o primeiro problema quando a pessoa que sofreu o dano morre ou então fica em estado inconsciente. No primeiro caso o valor da indenização vai para quem? Para os familiares? Para os colaterais? Até qual grau de parentesco? No segundo, é necessário a vítima ter consciência?

O valor da indenização no caso de morte vai para os sucessores do falecido.
Se não houver a morte a vítima mesmo em estado inconsciente recebe o valor da indenização por meio de seus representantes.

O acordo moratório durante o processo de falência

O Decreto Lei n.º 7.661/45 estabelecia que devedor e credor não podiam negociar o valor da dívida prorrogando o prazo para pagamento durante um processo de falência, mais este posicionamento ainda permanece com a nova Lei de Recuperação de Empresas e falências?

Para responder esta pergunta, deve-se entender o espírito de cada legislação e nos sentimos autorizados para falar da nova legislação pois tivemos participação ativa em sua reforma e não fomos apenas espectadores.O Decreto-Lei n.º 7661/45 era criticado por ser extremamente formalista enquanto legislações mais adiantadas, como a francesa era mais flexível(1). O formalismo consistia no fato do devedor seguir exatamente o que estava previsto na Lei para ele se beneficiar de sua "recuperação judicial", a qual era conhecida por concordata.

Se o devedor cumprisse com os requisitos ali mencionados recebia o beneficio da concordata, se não fossem satisfeitos, tinha sua falência declarada. Credor e devedor não podiam negociar o valor da dívida, assim, se o devedor quisesse se recuperar, poderia pedir concordata e escolher se pagaria seus credores à vista, em 6, 12, 18 ou 24 meses e a legislação dava um desconto no valor da dívida para as 4 primeiras situações.Aquela legislação era formalista não somente para a "recuperação" do devedor, mais também nos casos de falência. Assim, o credor possuindo um crédito de R$ 100,00 poderia pedir a falência do devedor.O Decreto-Lei n.º 7661/45 começou a ser visto como ultrapassado. Sua defasagem estava centralizada no fato de sua rigidez que não permitia ao devedor negociar suas dívidas com seus credores.

Ainda, o Decreto não permitia que o empresário que tivesse passando por dificuldade financeira provisória viesse a se recuperar quando não preenchesse os requisitos determinados no Decreto para se recuperar.A nova Lei de Recuperação de Empresas e Falência (Lei n.º 11.105/2005) veio com outro espírito, qual seja, o de permitir que devedor e credor negociem suas dívidas.

Este espírito da Lei tem a finalidade de permitir que o devedor em dificuldade financeira provisória possa se recuperar e ninguém melhor que o devedor para saber o tamanho de suas dificuldades. Saímos de uma legislação rígida onde não existia negociação da dívida e passamos para um novo sistema que permite esta negociação. Esta negociação deve ser permitida não somente nos casos de recuperação, mais também nos casos de falência, pois, qual o motivo de vedar esta negociação? Afirmar que a mora descaracteriza a impontualidade do devedor como ocorria no século passado?
Tal argumento contraria o espírito da nova legislação como demonstrando e ainda viola o artigo 167 que permite a realização de acordos de direito privado entre credor e devedor.Tal lógica é clara para aqueles que entendem a sistemática da nova legislação, assim, vamos para o mundo real. Um devedor para pedir recuperação judicial ou extrajudicial terá custos elevadíssimos com estes processos, sobretudo com o primeiro, por exemplo, porque terá que contratar profissionais para fazer um plano de recuperação.

Este devedor sabe que seu problema se refere a um ou poucos credores, os quais ele sabe que tem condições de pagá-los. Qual seria o motivo de não permitir que ele viesse durante um processo de falência a negociar o valor de suas dívidas com estes credores? Nenhum!

Então, porque obrigá-lo a pedir recuperação se ele sabe que pagará estes credores? Se ele pedisse recuperação teria que envolver outros credores e aumentariam suas despesas, daí sim saberia que não teria condições de se recuperar.Como se percebe, não existe lógica para não permitir que o credor conceda moratória ao devedor num processo de falência. Esta concessão fica condicionada ao pagamento da dívida, ou seja, se o devedor pagar se recupera e se não pagar tem sua falência declarada.

Tal raciocínio nos parece o compatível com este novo século, pois, se o devedor não teve condições de pagar sequer o credor que pediu sua falência, estaria ele em condições de pagar os demais que não pediram? Parece que não! E se ele cumprir o acordo com este credor qual será a conseqüência? Não terá sua falência declarada!

É possível descumprir o contrato licitamente?

O contrato vincula as partes para que produza efeitos jurídicos, ou seja, num primeiro momento o que é contratado deve ser cumprido. Mas, será que seria possível contratar e descumprir aquilo que foi contratado baseado na lei?

As inexecuções lícitas não são muito numerosas, porém, não são poucas, normalmente elas tem por finalidade proteger o devedor inadimplente.

O inadimplemento lícito está previsto na nova lei de recuperação de empresas e falências ao permitir que o empresário apresente um plano de recuperação judicial especial e parcele seu débito até 36 meses, ou seja, o que ficou estabelecido contratualmente anteriormente entre seus credores e o devedor perde efeito diante da abertura deste processo de recuperação. Neste caso a proteção do empresário ocorre para que a empresa seja mantida, os empregos sejam preservados e a fonte de arrecadação de impostos continue, esperando que o devedor em dificuldade passageira possa se recuperar.

Nas relações de consumo o descumprimento do compromisso de compra e venda de imóvel por parte do consumidor inadimplente de boa-fé, ou seja, aquele que não tem condições de continuar pagando a dívida contraída mediante prestações também é lícito, porém, ele será sancionado pelas perdas e danos, se houver. Ainda, o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar da sua assinatura ou do ato de recebimento, do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento empresarial, como por exemplo, através da internet.

A força do contrato é obrigatória e vincula as partes contratantes até que não fique constatado em desequilíbrio significativo do contrato. Neste caso, a cláusula contratual também poderá ser descumprida, sem que o causador do descumprimento seja punido. Uma cláusula é considerada abusiva quando num compromisso de compra e venda de um veículo em 24 prestações de
R$ 1.000,00 estiver estabelecido que o comprador perderá todo o valor pago e ainda devolverá o veículo se não houver pago uma das parcelas, sendo está a última por exemplo. Uma pessoa de inteligência mediana percebe claramente que haverá um desequilíbrio no contrato, ou seja, a força obrigatória do contrato não produz efeitos diante do evidente desequilíbrio contratual.

A inexecução lícita do contrato, como tivemos a oportunidade de demonstrar, ocorre devido a uma proteção legal concedida a certos contratantes por uma questão de utilidade pública e também para manter o equilíbrio contratual.

Dano moral e assédio moral na Justiça do Trabalho são a mesma “coisa”?

Existem certas interrogações que são feitas no direito que são questões complicadíssimas. Esta é uma delas: assédio moral e dano moral são a mesma "coisa"?
Ao serem analisadas as condenações na Justiça do Trabalho, o posicionamento da doutrina, chegamos a conclusão que não existe um posicionamento claro sobre o assunto.Advogados relatam os fatos nas relações de trabalho e emprego e ao final de suas demandas pedem a condenação do empregador pelo pagamento de indenização por danos morais face ao assédio moral vivenciado pelo empregado, julgamentos são proferidos sem que nenhuma distinção entre assédio moral e dano moral e a doutrina escreve artigos citando julgados também sem nenhuma diferença.
Mas qual a finalidade desta diferença, se é que existe?Primeiramente cabe se destacado que o assédio moral não ocorre somente nas relações de trabalho, o assédio moral também ocorre em família, ocorre nas relações civis, etc, como bem destacada uma das pioneiras no assunto em matéria de assédio moral, a psiquiatra francesa Marie-France Hirigoyen.
Tendo visto verdadeiros absurdos neste tema, uma ignorância tão grande que é impossível de ser medida. As pessoas vêm falando o que querem, cada um inventa o que está pensando para fundamentar seu palpite sobre assédio, sem nenhuma prova científica, é óbvio! Assédio moral é um estudo científico, assédio é ciência, assédio não é palpite jurídico!A tese do assédio moral não é uma tese jurídica, é uma tese médica, ela nasceu através de anos de estudos realizados na Suécia pelo médico psiquiatra alemão Heinz Leymann, este foi o "pai do assédio moral". Posteriormente ela foi desenvolvida na França pela médica psiquiatra Marie-France Hirigoyen e bem estuda por Herald Ege na Itália, ou seja, quem não conhece o que estes autores falam, não tem condições de conhecer bem o tema e daí confundem assédio moral com dano moral!O assédio moral possui algumas diferenças com relação ao dano moral, mais, em alguns casos existe um encontro entre eles.
O assédio moral exige que sejam realizadas práticas hostis de forma reiterada, com uma certa freqüência e duração.A freqüência, estatisticamente como disse Heiz Leymann e não um palpiteiro é de uma vez por semana.
A duração é estatisticamente comprovada por Heinz Leymann e não por um palpiteiro, de pelo menos 6 meses. Os palpiteiros deveriam realizar um estudo de 20 anos e sustentar mundialmente sua tese e esta ser aceita pela comunidade científica, como fizeram os defensores da tese do assédio moral.Aqui existe de uma forma geral uma diferença com o dano moral, pois no dano moral não são feitas estas exigências, um simples ato pode caracterizar o dano moral.
Existe também uma aproximação. Certos atos por si só, sem a presença de freqüência e duração podem caracterizar o assédio. Mais como? Basta ver que é uma estatística feita por Heinz Leymann, o que representa a regra geral. Logo um ato seria então dano moral e assédio moral? Não, pois aqui existe uma diferença em matéria de provas: o prejuízo no assédio moral precisa ser provado, não se presume como no dano moral! Exemplo: alguém é caluniado.
Presume-se que alguém caluniado seja afetado psicologicamente e até fisicamente por problemas de saúde. No assédio moral não existe esta presunção, a vítima tem que provar que teve problema físico e/ou psicológico.Também em matéria de prova entende-se que no dano moral o fato deve ter sido levado a conhecimento de terceiros enquanto no assédio moral não existe esta necessidade.
A finalidade em se fazer estas distinções é muito importante sob o ponto de vista da avaliação do dano moral, pois, percebe-se que o assédio moral causa uma dor e sofrimento comprovados a vítima enquanto que o dano moral não tem necessidade destas provas. Com isso, percebe-se que as indenizações por assédio moral devem receber um valor maior do que muitas indenizações por danos morais.
A partir do momento em que forem ignoradas estas diferenças, precisaremos saber do que se trata? É assédio? É dano moral? Dano extrapatrimonial? Como identificar um ou outros? Sabemos que hoje o assédio moral é visto como uma espécie da qual o gênero é o dano moral, assim como outra espécie é o dano estético. Ocorre que precisam ser analisadas as diferenças, sob pena de não sabermos mais o porquê numa condenação, já que dano moral e assédio moral não se confundem!

Da responsabilidade penal pelos danos a integridade

In memoriam da juíza Eliane AlfradiqueAs pessoas estão somente preocupados com as lesões que vêm, porém, nossa sociedade não está acostumada com as lesões psicológicas, as quais vem a trazer enormes prejuízos para a saúde das pessoas.
Quando abordamos os efeitos do assédio moral por exemplo e os problemas que podem ser levados à saúde de uma pessoa não temos dúvida nenhuma que o assediador deve ser responsabilizado criminalmente, inclusive chegando ao ponto de responder por homicídio doloso quando ficar provado o nexo de causalidade e a perda da vida de uma pessoa.
Vou ser claro e espero que não haja protecionismo, pois o direito deve viver da realidade social e não do protecionismo, citando o seguinte exemplo: uma pessoa assediada passa a ter problema de saúde com depressão e em virtude deste estado depressivo lhe surge um câncer que a leva a morte.
Ao serem verificadas as provas, constata-se que um ano antes a pessoa não tinha nenhum problema de saúde, no ano seguinte constata-se o câncer e no outro ela morre devido ao câncer. Fica comprovado o nexo de causalidade entre a conduta do assediador e morte. Neste caso não tenho dúvida que o assediador deve responder por homicídio.
Vamos a outros exemplos: uma pessoa traída que tem passa a ter problemas psicológicos, não conseguindo dormir e ainda acaba tendo uma úlcera. Outro: uma pessoa é acusada injustamente de um crime e pouco tempo depois novamente de outro. O dano psicológico lhe traz problemas de insônia, além de lhe trazer problemas intestinais. Não tenho dúvida que quem deu causa deve ser responsabilizado penalmente, pois acusar alguém injustamente da prática de um crime é muito grave.
Estamos numa nova era, não são somente os instrumentos materiais que matam, os "instrumentos" psicológicos como as palavras, os gestos, a perseguição psicológica, entre outros, também ferem e matam porque eles acabam sendo somatizados no corpo da pessoa. Basta vermos os incontáveis casos de problemas de saúde que são causados pelo stress e o stress nada mais é do que uma condição preliminar ao assédio moral. Ainda é importante ser destacado que cada situação destas dependerá da reação de cada pessoa, pois, por exemplo, uma traição não poderá afetar a outra. Por isso, o prejuízo tem que ficar demonstrado.
Faço tais afirmações com plena convicção, pois pesquisas realizadas confirmam que a probabilidade das pessoas contraírem doenças quando passam por situações de stress constante em certo período de tempo é grande e fica ainda demonstrado que estas pessoas adquiriram doenças devido ao assédio. Isso é cientificamente provado, não se trata de uma tese jurídica, ou seja, tal situação não poderá ficar "ao gosto" de cada julgador!Não somente deverá haver a responsabilidade penal destas pessoas como também deverão responder pelos danos civis.
Estamos numa era onde não somente os instrumentos materiais ferem e matam, os "instrumentos" psicológicos também!(1) É tão notório o número de pesquisas que relacionam situações de stress a doenças que basta dar uma navegada na net para ver. Ainda, sob o ponto de vista científico, basta consultar a doutrina médica e psicológica e ver as conseqüências do stress na saúde das pessoas.